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A escuta e o ato analítico nas instituições penais


Historicamente, o entrelaçamento entre as duas ciências – Psicologia e Direito – restringiu o campo do conhecimento psíquico ao fornecimento de documentos que possam auxiliar o aparelho judicial em suas convicções e decisões jurídico-penais. Desse modo, a atuação da Psicologia Jurídica já tem seu "status" demarcado num lugar pericial, ou seja, a um arsenal de entrevistas, testes e exames psicológicos que buscam traduzir o que é da ordem da subjetividade do examinando com a pretensão de prever seu comportamento futuro ou de revelar a verdade dos fatos aos juízes, promotores e demais operadores jurídicos.


Decorre que, ao responder à demanda judicial, o perito apresenta seus laudos ou pareceres técnicos adotando, ele próprio, uma visão positivista-cartesiana do sujeito, pois ele descreve aquilo que supõe ser a verdade do mesmo: ”A posição cartesiana do perito serve, apenas, para garantir a onipotência narcísica do profissional que acredita ser possível responder a demanda jurídica com a verdade cartesiana.”(Barros, 1997).


Contudo, à luz da psicanálise, a descrição contida nos laudos periciais só pode oferecer “meia-verdade”, pois a verdade do sujeito é da ordem do inconsciente, e se revela onde não se reconhece: nos atos falhos, nos sonhos, nos chistes, enfim, nos fenômenos lacunares de seu próprio discurso. Como não há como dizer o sujeito em um único significante, não há como dizer a verdade em sua totalidade. Falamos aqui do sujeito do inconsciente, inaugurado por Freud, e que só aparece nas entrelinhas não podendo ser traduzido como pretende a perícia judicial.


Minha formação psicanalítica levou-me então a buscar um lugar na Instituição Penal onde a escuta analítica e as intervenções de um psicanalista pudessem se sustentar em sua dimensão ética.Para além do divã e do setting analítico, fiz uma aposta na transferência e na possibilidade de escutar o inconsciente, me distanciando do caminho pericial.


No artigo sobre a” Psicanálise e a Criminologia “de Lacan, 1950, há indicações de um tratamento possível ao criminoso. Se, do ponto de vista juridico-penal a sentença tem uma função punitiva no sentido em que é retribuitiva do delito e proporcional à natureza e gravidade do mesmo, a sentença traz consigo também uma função ética na medida em que deve servir para o criminoso reconhecer sua culpabilidade e responsabilidade. "Apenas a Psicanálise, por saber como considerar as resistências do eu, é capaz de destacar a verdade do ato, engajando aí a responsabilidade do criminoso através de uma assunção lógica, que deve conduzi-lo à aceitação de um justo castigo”.Lacan,1950)





INDICAÇÕES BIBLIOGRÁFICAS PARA CONTINUIDADE DO ESTUDO:


FREUD, S. Obras completas. Imago, 1986.

Vol. XII- Recordar, Repetir e Elaborar - 1914

Vol. XVIII- Além do Princípio do Prazer- 1920

Vol. XXI- O Mal-Estar na Civilização- 1930


BARROS, F. O. O amor e a lei : o processo de separação no tribunal de família. In: Psicologia, Ciência e Profissão, n.3, 1997.


LACAN, J. Psicanálise e Criminologia. In: A Lei e a lei. Palavração, Revista de Psicanálise. Curitiba, l994.


MELMAN, C. Alcoolismo, delinquência e toxicomania. Escuta, São Paulo, 1992.


PHILLIPI, J.N. Reflexões acerca do sujeito do Direito. In: A Lei e a lei. Palavração, Revista de Psicanálise, Curitiba, 1994.



 

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